Certa vez, estava lendo a tradução de
uma música que gostei. Sabe como é né, como meu inglês não é lá grande coisa,
tive que recorrer à um desses sites de tradução de música para ter a certeza de
que não estava cantando "embromeichamente" alguma música que fala
sobre vômito ou zoofilia, o que seria degradante, além de decepcionante.
A música em questão é "Royal" da Lorde. Imediatamente, percebi
que era um ataque àqueles vídeo clips americanos, que são um mix de ostentação
e banalidade, muito copiados atualmente pelos funkeiros ostentação de São
Paulo. Lembro que a primeira relação que fiz com a letra que acabara de
desvendar foi com um clip da Miley Cyrus - "We can't stop", que
estava passando muito na MTV. Pensei que fosse um tipo de demonstração de
aversão àquela maneira de "vida", como no ano 2000 quando a Avril
Lavigne desdenhava a Britney Spears.
No entanto, numa dessas minhas reflexões baseadas na realdade, me dei
conta de que tudo aquilo que a música dizia, fazia sentido em muitos âmbitos da
vida real. Um em especial me chamou a atenção. Atualmente nossa vida é invadida
pela exposição de pessoas, que relativamente, de alguma forma gostaríamos de
ser, um estilo de vida que gostaríamos de ter. É natural do ser humano querer
melhorar, querer crescer... acredito fielmente que ambição não é má, a partir
do momento que não prejudiquemos ninguém. Mas de repente me dei conta, pelas
experiências que já tive, que talvez esse "mundo", não me pertença.
Como diz a música, essa realeza não corre no meu sangue.
E não estou falando de riqueza, nem do casamento do príncipe William com
a Duquesa de Cambridge Kate não. Estou falando de um degralzinho acima do meu
círculo social. Não cabe. Eu vivo no mundo onde se conta o dinheiro da passagem
do ônibus e não no mundo que se troca de carro. Eu vivo no mundo onde o meu relógio,
por mais brilhante que pareça, foi comprado no camelô por no máximo quarenta
reais e não num site glamouroso ou numa lojinha empolada de shopping. Nem vem
com garantia. Vivo no mundo onde a minha bolsa descasca, meu celular não é
touch screen, minha roupa não é de lojinha descolada de shopping, minha unha e
meu cabelo são feitos por mim e o sapato mais caro que tenho custou cem reais.
Mas o outro mundo é bem mais atraente que o meu.
E percebi mais ainda. Percebi que mesmo que eu seja inteligente,
sociável, que tenha cãibras no braço de tanto escovar o cabelo, que me mate de
trabalhar para comprar um óculos Ray Ban e gastar metade do que ganhar para me
vestir "adequadamente", me sacrificando no transporte público de
salto alto para fazer um programa invejável na zona sul, ou uma balada regada a
Red Bull, luz negra e raios neon, eu nunca serei da realeza. Seria sempre,
sempre e sempre uma intrusa. É verdade, já tive a oportunidade de passar por
isso e não foi legal. Percebi, que estaria me esforçando para ser uma pessoa
que não sou. Eu não sou. Eu não gravo vídeos de resenhas sobre cosméticos
importados, não compro itens colecionáveis de seriados americanos, não gasto
fortunas com produtos para cabelo e não faço tratamentos obscenamente caros para
as manchas e espinhas do rosto.
Por mais que seja uma pessoa positivamente próspera, eu nunca serei o
que queria ser, eu não nasci assim, eu não cresci com estes privilégios,
pareceria ridículo..."esse tipo de luxo não é para nós". E esta tese
é percebida de ambas as partes. Eu percebo que não pertenço à esta sociedade e
por sua vez, esta sociedade nunca me enxerga como uma deles. Nunca. O chato e
você pensar que poderia ser aceita e depois perceber que para participar deste
meio não. Para qualquer outra coisa sim, mas para conviver não. E aceitar isso
não é fácil. Porque a realeza continua lá, sem perceber, esfregando-se na nossa
cara.
No entanto, conheço várias pessoas que ascenderam e entraram para a
realeza. Mas sei que no fundo, o coração é de plebeu. Como sei disso? Porque
nesse meio sou aceita. Contudo, estes não são a realeza de verdade. São um tipo
de "novos ricos". E desde que mundo é mundo os emergentes são
apontados. Mas se esta mácula é o preço da prosperidade, que assim seja. Se
conformar leva tempo, talvez lá no fundo, nunca me conforme. Mas dói. Ser
podado incomoda. Mas, não nasci na realeza. Não posso fazer nada quanto à isso.
Só posso ser eu e é o que deve bastar.